Dia Mundial do Combate ao bullying
Por Sílvia Carvalho da Silva, sócia da SPLS e Enfermeira Especialista em Saúde Comunitária
O fenómeno de bullying pela sua crescente intensificação foi projetado, para a atualidade, como uma problemática de saúde pública.
Os comportamentos de bullying referem-se a atos de violência física, verbal e/ou psicológica, com caráter intencional, repetitivo e no qual se verifica um desequilíbrio de poder entre a(s) vítima(s) e o(s) agressor(es). Os comportamentos de bullying podem assumir agressões físicas, verbais, psicológicas, sociais e com recurso às novas tecnologias, designado por cyberbullying.
Este fenómeno está, frequentemente, associado ao contexto escolar e peri-escolar, representando um impacto fortemente negativo no bem-estar e saúde mental da(s) vítima(s). A evidência do impacto pode não ser imediata e as potenciais repercussões, no estado psico-emocional da vítima, podem traduzir-se na afetação da sua autoestima, ansiedade, tristeza, alterações no sono, podendo conduzir ao absentismo e abandono escolar e, em casos mais extremos, a comportamentos auto lesivos e suicidas.
Importa esclarecer que, nem todo o tipo de violência pode ser considerado bullying, mas qualquer tipo de bullying é uma forma de violência, e estes comportamentos, pelo impacto fortemente negativo sobre todos os intervenientes, devem ser combatidos.
O crescimento deste tipo de violência é transversal aos diferentes níveis de escolaridade (CDC, 2022), com maior prevalência na faixa etária entre os 13 e os 15 anos, conforme evidência do estudo da UNICEF, em 2017, no qual 130 milhões de alunos, entre os 13 e os 15 anos, referiam ser vítimas de bullying e cerca de 3 em cada 10 alunos admitiam ser agressores. O Observatório Nacional de Bullying, entre 2020 e 2023, registou um total de 627 denúncias, reiterando a prevalência do fenómeno em vítimas com cerca de 13 anos e com predomínio no sexo feminino. Importa salientar que, em 93% dos casos denunciados, no portal Observatório Nacional do Bullying, as vítimas e agressores frequentavam o mesmo estabelecimento de ensino, recreio e os intervalos escolares são o palco privilegiado para a ocorrência destes eventos.
É inequívoca a necessidade de trabalhar a literacia em saúde, em contexto escolar, associada ao fenómeno do bullying, envolvendo e empoderando cada interveniente (vítimas, testemunhas e toda a comunidade educativa e escolar) para o reconhecimento do seu papel, potenciando a prevenção precoce do fenómeno e a intervenção assertiva face à ocorrência de um evento, com vista à erradicação dos comportamentos de bullying.
Por conseguinte, é emergente assegurar a existência de equipas interdisciplinares (docentes, não docentes, psicólogos escolares, encarregados de educação, representantes dos alunos), que em cooperação com as equipas de saúde escolar locais, definam e implementem intervenções com o objetivo de capacitar a comunidade escolar para atuar face ao fenómeno do bullying. Para a irradicação deste tipo de violência é fundamental o envolvimento dos profissionais de segurança, do programa escola segura, e das autarquias locais, em concertação com estas equipas interdisciplinares.
A capacitação da comunidade escolar para agir face ao fenómeno do bullying deve considerar a promoção de debates sobre a importância de relações saudáveis e formações para o desenvolvimento de competências socioemocionais; a identificação precoce de fatores de risco; a intervenção assertiva face à ocorrência de comportamentos de bullying; a criação de espaços de consulta, apoio e suporte profissional (para vítimas, testemunhas e agressores) nos estabelecimentos de ensino; a criação de espaços físicos e virtuais de denúncia de casos de bullying e ainda a criação de redes de apoio comunitário, neste âmbito. Face à ocorrência de comportamentos de bullying todos os intervenientes devem ter oportunidade de aceder ao apoio de um profissional de saúde, para avaliação da sua condição e potencial encaminhamento para os serviços adequados.
A luta contra os comportamentos de bullying será ganha se todos se sentirem implicados nela.
A importância da união para irradicar esta e outras formas de violência é inequívoca, pois as consequências negativas associadas ao fenómeno do bullying, podem ecoar durante toda a vida adulta daquele que sofreu a violência, daquele que a perpetrou e na vida daquele(s) que cresceram a testemunhá-la. Todos têm direito a crescer e a viver numa escola sem violência, que promova a saúde e o bem-estar, para garantir o sucesso da aprendizagem dos alunos e o bem-estar das famílias, da comunidade escolar e da sociedade em geral.
A UNESCO (2022) defende a mudança de paradigma para colocar a felicidade no centro da política e das práticas educativas. A responsabilidade para a redução desta problemática não se circunscreve ao reduto escolar, mas apresenta-se como um desafio comunitário e societal. O desafio global é educar para a paz, para a aceitação do outro com as suas especificidades e diferenças.