GUIA DE RECURSOS SOBRE A DOR
Nova definição de Dor (IASP)
“A Dor é sempre uma experiência pessoal que é influenciada em vários graus por fatores biológicos, psicológicos e sociais”
- A pessoa é importante no contexto de Dor, pois refere a sua Dor de forma individual, deve ser acreditada e permite uma melhor avaliação e orientação;
- A Dor tem um significativo impacto na vida da pessoa e família e isso deve sempre ser considerado;
- A necessidade da multidisciplinaridade na avaliação e no tratamento da Dor.
Uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a, ou semelhante à associada a dano tecidual real ou potencial
Descrever a Dor
- Dor e nociceção são fenómenos diferentes. A Dor não pode ser inferida apenas a partir da atividade nos neurónios sensoriais;
- Através de suas experiências de vida, as pessoas aprendem o conceito de Dor;
- O relato de uma pessoa de uma experiência como Dor deve ser respeitado;
- Embora a Dor, geralmente, tenha um papel adaptativo, ela pode ter efeitos adversos na função e no bem-estar social e psicológico.
- A descrição verbal é apenas um dos vários comportamentos para expressar Dor; a incapacidade de se comunicar não nega a possibilidade de um ser humano sentir Dor.
10 mitos sobre a dor
Mito 1
A dor é o resultado natural do envelhecimento
O que é verdade...
Embora a dor às vezes venha com a idade, há uma diferença entre a dor incómoda do desgaste físico e a dor crónica. A dor crónica pode ser o resultado de uma doença ou lesão e também está relacionada a dores nas costas, cancro, artrite, dor de cabeça e nevralgia. A dor crónica não está concentrada numa faixa etária, ela varia com a idade.
Mito 1
A dor é o resultado natural do envelhecimento
O que é verdade…
Embora a dor às vezes venha com a idade, há uma diferença entre a dor incómoda do desgaste físico e a dor crónica. A dor crónica pode ser o resultado de uma doença ou lesão e também está relacionada a dores nas costas, cancro, artrite, dor de cabeça e nevralgia.
A dor crónica não está concentrada numa faixa etária, ela varia com a idade.
Mito 2
É melhor resistir e apenas viver com a dor
O que é verdade…
Nunca tente apenas aguentar a sua dor e sofrer. Há um tratamento disponível para todos os que sofrem com dor. Ignorar a sua dor pode ter consequências sérias, especialmente se optar por se automedicar de maneiras não saudáveis em vez de consultar um profissional de saúde.
Mito 3
Fazer exercícios quando estiver com dor causa ainda mais dor
O que é verdade…
Exercícios como fisioterapia podem ser essenciais para o sucesso da reabilitação. Exercícios leves a moderados podem até ajudar a reduzir o stress, melhorar o fluxo sanguíneo e de oxigénio para os músculos.
Os benefícios do exercício não param apenas no nível físico — o exercício é conhecido por melhorar o humor e é considerado um tratamento eficaz para a depressão, frequentemente associada à dor crónica.
Mito 4
Podemo-nos tornar dependentes de analgésicos se os tomarmos durante muito tempo
O que é verdade…
A incidência de dependências entre pacientes com dor crónica é quase a mesma que na população em geral.
A melhor maneira de se proteger contra a dependência? O seu médico irá trabalhar consigo para garantir que recebe a dose certa no período de tempo certo.
Mito 5
A dor crónica pode matar
O que é verdade…
A dor crónica não pode matar, mas pode ter um efeito profundo na qualidade de vida. Pessoas que sofrem de dor crónica têm duas vezes mais probabilidade de relatar comportamentos suicidas ou cometer suicídio. A luta constante contra a dor crónica pode ser suficiente para que algumas pessoas se sintam sem esperança e, infelizmente, pensem no suicídio.
Mito 6
Pensar demasiado na dor não a tornará pior do que já é
O que é verdade…
O sofrimento psicológico que acompanha a dor física pode certamente torná-lo mais infeliz, e insistir nos pensamentos sobre a dor pode servir para a enfatizar.
Lembre-se de que controlar em vez de curar a dor crónica é o objetivo do tratamento.
Mito 7
A medicação é a única coisa que ajuda
O que é verdade…
Quando as pessoas ouvem “dor crónica” e nunca sofreram com isso tendem a pensar que é tão fácil quanto tomar alguns analgésicos e relaxar por alguns dias. Isto não é verdade. A dor crónica difere de outros tipos de dor por não ser tão facilmente tratada. Embora a medicação possa definitivamente ajudar no tratamento da dor crónica, não é suficiente no longo prazo.
Mito 8
dor é proporcional ao dano
O que é verdade…
Este é outro mito comum que pode ser prejudicial aos pacientes. Se os níveis de dor forem altos, pode-se pensar que o dano deve ser alto também, mas não é o caso.
A dor crónica é altamente complexa e muitos pacientes podem-se deparar com uma dor intensa decorrente de um problema relativamente benigno. Da mesma forma, os pacientes podem sentir uma pequena quantidade de dor a ocorrer com problemas mais graves. Já notou um hematoma que não se lembra de ter sofrido? Esse é um exemplo de dano ao tecido sem dor.
Mito 9
A dor crónica está na sua cabeça
O que é verdade…
“Está tudo na mente”. Quantas vezes isto foi dito a alguém com dor crónica? Bem, infelizmente, há muitas pessoas que acreditam que, como a dor crónica muitas vezes não pode ser vista, deve estar apenas na cabeça do paciente. É verdade que há um aspeto mental da dor crónica e a mentalidade pode ter muito a ver com a gravidade, mas, em última análise, a dor crónica não é criada pela mente. Insinuar isso pode ser um insulto para aqueles que sofrem com ela.
Mito 10
Tem de haver uma causa física para a dor crónica
O que é verdade…
Quando se ouve o termo dor crónica, é comum pensar imediatamente em coisas como artrose e dor nas costas, em que a dor afeta uma área física, que afeta e não se estende a lugar nenhum além disso.
Mas a dor crónica não é tão simples. Muitas vezes referida como “a deficiência invisível”, este tipo de dor nem sempre tem uma área física que afeta.
Para quem sofre de doenças como a fibromialgia, esse mito é especialmente desconcertante. A fibromialgia é definida por “dor generalizada e rigidez muscular”
Na primeira pessoa
Alertar, dar a voz, participar.
Eis os testemunhos dos que deram voz a este guia:
As visões de cada uma destas pessoas na sua avaliação da dor, do que passaram e como se sentem e, sobretudo, como superam a dor. Exemplos vivos de coragem.
A dor é um sinalizador ativo psíquico e físico para reconhecimento do desalinhamento com o nosso ser autêntico ou a nossa natureza mais profunda, não afetada por condicionamento ou pressão de conformidade cultural, por crenças, autoimagem, ancestralidade ou karma (princípio de ação e reação sequencial da vida).
O que me aconteceu?Uma quase epifania aos 54 anos de vida, na qual me apercebi, através de um evento espontâneo, que era uma pessoa transgénero, clarificando toda a dor de uma existência extremamente desconfortável até então.
Como supero a dor?
Mais do que com quaisquer técnicas ou ferramentas para lidar com as diversas expressões da dor existencial, com coragem (agir com o coração consciência).
Traduzindo na prática e aplicando ao processo de transição, decidindo iniciá-lo com esta idade, dizendo pela primeira vez um grande sim ao que genuinamente sentia. Dando voz a esse coração consciência, à revelia de todos os conselhos, opiniões, vontades e pressões familiares de maior ou menor expressão ou intensidade, ressalvando que a maior parte da minha família aceitou e apoiou este processo completamente.
Sendo consistente nessa decisão, dando todos os passos de forma sensata, aproveitando o privilégio de o fazer com a maturidade devida à experiência de vida.
Pesquisando, estudando, decidindo, realizando. Trabalho com público e, mesmo neste contexto, o processo decorreu com uma aceitação simples e natural. Sou mesmo privilegiado! Não obsta a que haja processos intensos e, por isso, mais difíceis, mas a energia que conduz tudo, de um grande “sim,” ajuda sempre a encontrar o melhor caminho para serenar e prosseguir.
A vida é Boa.
"O Alexandre é um observador sensível, crente utópico dos caminhos da paz, pensador do improvável, curioso irredutível, com os pés bem assentes na Terra. A formação e treino base em Engenharia sustentam o reconhecimento da vida como radiância de puro amor".
Começamos a lidar com a dor desde o nascimento, ao sairmos do ventre materno e sermos confrontados com um ambiente diferente, barulhento, com cheiros e pouco confortável. Mas não nos recordamos desse momento de dor.
Ao longo da vida, deparamo-nos com diversos tipos de dor. A física, a emocional, maior, menor, suportável, longa, curta.
É assim com todos e não foi diferente para mim.
Enquanto crescia, a dor surgia, de vez em quando, das mais variadas maneiras.
Quando comecei a levantar-me para aprender a andar, caía e tornava a tentar com algum receio, dor e desconforto.
Ao começar a andar de bicicleta e esfolava os joelhos, as cabeçadas nos armários quando estava distraída, um pé torcido no ballet, um braço ou mão magoados, um entalão de dedo na porta e mais tarde, as dores mensais próprias das mulheres.
E sem esquecer as dores de tristeza pelo acabar de uma relação ou a dor da saudade pela partida ou perda de alguém.
Por isso, para mim, a dor é algo pessoal, pois é através da minha própria experiência que eu conheço a dor e, por essa razão, é subjetiva.
Mas tenho consciência de que é inevitável.
Já adulta, aos 29 anos, senti das maiores dores que fisicamente sofri.
A minha queda do 8.º andar, que teve como consequência a minha paraplegia a nível D12.
Nesse acidente, parti o braço com fratura exposta, três costelas com perfuração de pulmão, a cabeça e a coluna na zona dorsal.
Para quem nunca tinha entrado num hospital, as dores foram insuportáveis. Duas semanas e meia a morfina.
Mas o lado bom dessas dores é que foram diminuindo e o "sentir" físico acaba por ser esquecido, lembrando-me apenas de que as tinha tido e que tinham sido intensas.
Das dores emocionais, tive a perda do meu pai, a quem eu era muito ligada. A sua falta fez o meu mundo ruir e perdi um pouco o norte (como se diz).
E a perda da minha filha, que foi muito desejada e não chegou viva ao fim da gravidez.
Ambas as dores foram solitárias, cruéis, sem sentido, como qualquer dos mortais pensará da sua dor.
Nunca esqueci essas dores embora sejam atenuadas com o passar do tempo.
Para todas as dores físicas que eu senti, tenho presente na minha cabeça que elas vão diminuindo ao longo do tempo.
Pode demorar um pouco, mas deixo de as ter e, embora me lembre de que elas existiram, não as sinto mais.
Para mim, isso é um conforto e faz com que qualquer dor física se torne suportável. Também sei que tenho uma grande capacidade de aguentar as dores.
Quanto à dor emocional, a dor da alma, é mais difícil. É a pior. Invisível. Inigualável. Para ela, tento encarar a vida vendo sempre o copo meio cheio, por mais duro que possa ser.
Desenvolvo dentro de mim a capacidade de olhar com esperança, com aprendizagem, de frente (sem fugir). Ouvindo-a e respeitando-a.
Pode deixar uma cicatriz para sempre na alma, mas sei que a falta de respiração que ela provocou com a sua imensidão será diluída.
E, para complementar esta paz e tranquilidade ao encará-la, pratico meditação.
Ultrapasso as minhas dores, sejam elas físicas, psicológicas ou espirituais com a maneira como encaro a vida.
Tenho a tendência para ver sempre o copo meio cheio.
Acredito em mim, por mim e para mim.
A força e o otimismo surgem dentro de mim e emergem com solidez.
É a tudo isso que me agarro, para além de encontrar no mais minúsculo a beleza que nos rodeia.
Quer nas pessoas, quer no quotidiano.
Penso que é a melhor maneira de estar neste caminho que traçamos todos os dias.
Pensar nos outros também me ajuda a minimizar o que passo.
Apoiar com doçura e sem julgamentos o outro traz-me serenidade para encarar os meus momentos menos bons.
A Fénix renasce do pior, das próprias cinzas. E voa, livre, e no seu melhor. Com a sua força.
Embora uma figura mitológica, eu acredito no simbolismo da Fénix, o recomeço e a esperança de um futuro melhor.
Tenho presente uma frase de Friedrich Nietzsche: "Viver é sofrer, sobreviver é encontrar algum sentido no sofrimento".
Sendo uma pessoa com deficiência, nomeadamente, congénita, nasci sem os dois braços e uma perna, mas sou bastante ativo: trabalho, danço, faço coreografias, faço desporto, faço fisioterapia, cozinho, etc…. Devem estar a pensar agora que não tenho qualquer tipo de dor incomodativa, apenas aquela dor que até sabe bem, depois de um dia de exercícios. Pois, mas não, eu convivo com a dor
“Conviver com a Dor”. Poderia ser o título de um filme, é verdade, mas infelizmente é a realidade de muitas pessoas no seu dia a dia.
Não é crónica, nem fantasma, é mesmo dor muscular. Mas não é aquela dor que simplesmente passa com pomada ou comprimidos (tem dias), é uma dor que já faz parte de mim devido à escoliose que tenho nas costas, devido ao facto de ter só um membro (perna esquerda), de ao escrever ter de compensar todo o restante corpo para o conseguir fazer e manter o equilíbrio.
Existem vários tipos de dor, como por exemplo:
A crónica, que pode ser considerada a pior de todas, por muitos, pois é aquela dor que já faz parte da pessoa, seja ela o que for, faça ela o que fizer.
A fantasma, que muitos não entendem. Muitos pensam que é imaginação da pessoa, mas não é, porque esta dor é bastante comum nos amputados, nos membros que, por alguma razão, tiveram de ser cortados. É exatamente nesse membro (ou a falta dele) onde reside esta dor que é real e bastante difícil de lidar.
A dor muscular, que, por esforço físico ou alguma lesão no músculo, causa bastante desconforto, quer numa só zona, quer no corpo todo, podendo ser leve ou extrema.
Estes são apenas alguns exemplos, mas é um panorama muito complexo e extenso para um leigo como eu na matéria estar a analisar mais a fundo, mas serve apenas dar uma pequena ideia do que é viver com a dor.
Com algumas estratégias:
Se faço fisioterapia? Sim uma vez por semana, com alongamentos e massagens.
Alivia? Sim, bastante.
Então porquê fazer só uma vez por semana? Simples, para ter vida não posso estar constantemente na fisioterapia e também não é algo propriamente barato para ter todos os dias.
Quais as alternativas?Quando a dor não é muito intensa, tento sempre descansar um pouco para aliviar e não piorar, mas quando não dá para descansar, aguenta-se. São escolhas!
Ao longo da minha vida, sempre tive dores, umas mais fortes que outras, sempre nas costas, rabo e pescoço. Não tendo membros, é a forma que tenho de compensar para conseguir fazer as coisas e manter o ritmo da vida.
Não me arrependo de nada e faria tudo novamente igual. Já me habituei a conviver com a dor, embora reconheça que seria bom não ter dores, mas é algo que não me impediu antes, nem me impede agora, de continuar a minha vida, de atingir os meus objetivos.
Tenho perfeita consciência de que se piorar procurarei alternativas para continuar a minha vida, mas nunca algo que me tire a mobilidade, como, por exemplo, operarem-me à coluna, que era o que queriam fazer quando era jovem, para me endireitarem a coluna.
Obviamente que recusei, pois ficaria sem dores, mas não seria a pessoa que sou hoje, ou o que faço atualmente.
Esperanças tenho sempre, pois sei que a medicina tem estado a evoluir bastante, mas não é algo que me tire o sono, ou que anseie por isso.
Não quero ser modelo para ninguém, muito menos um exemplo de vida. Como muita gente diz, apenas faço a minha vida como qualquer comum dos mortais, com menos dor ou mais dor.
Mas se alguém me perguntasse o que aconselharia, eu responderia que, se a dor não for algo que te incapacite ou algo que saibas que não te vai prejudicar a médio ou longo prazo, não deixes que te faça parar, não lutes contra ela, tenta encontrar um balanço entre a dor e o bem-estar.
Por fim, não permitas que ninguém tome as decisões da tua vida por ti, assume os riscos e os erros. Se tens dúvidas, pergunta, mas a decisão final é sempre tua!
Este tem sido o meu lema de vida e a forma como “abracei” a dor!
A dor e o amor andam de mãos dadas. São quantificáveis em escalas, mas, devido aos neurotransmissores que cada um canaliza de forma diferente, fazem toda a diferença no final global da individualidade. O que cada um sente é único, tanto no amor como na dor.
Quando, nos anos 90, parti o côndilo do maxilar direito, diagnosticaram-me com híper sensibilidade à dor. Aí senti pela primeira vez na minha vida o que é sentir dor.
Quando fiz a primeira operação aos ovários em 2015, mal acordei, levantei-me logo, dei uns passos, apesar de sentir dor.
Mas dor — e muita — voltei a ter nos cuidados intensivos, quando pedi para me darem um analgésico (nunca o faço) e obtive esta resposta: “a Cláudia está com a morfina máxima que podemos administrar”. Perante tal resposta, o meu foco passou a ser “transformar” uma garagem num apartamento, o qual fiz todo o processo necessário neste estado, canalizando o foco da dor para o de realizar uma coisa. Resultou e foi feito. Deixar de “ligar” à dor é essencial, senão há alturas em que se torna insuportável. O foco determina a forma e o grau do sentir.
Eu já sobrevivi a um cancro do ovário em 2015, a uma recidiva em 2018. Fui operada cinco vezes, fui ostomizada, reverti a ostomia e estou cá, cheia de força para ajudar quem precisa.
A autoimagem é alterada drasticamente e temos de deixar de ligar tanto ao invólucro e ligar mais ao interior, saber adaptar as circunstâncias da vida e, com elas, aprender a ter mais força para darmos também a quem precisa, pois afeta toda a família. Temos de nos focar na cura e não na doença. Viver não custa, custa é saber viver.
O levante a seguir às operações é muito importante. Dói e custa muito, custa, mas é pior quanto mais tempo deixarmos passar. É para doer, então mais vale sentir logo o que nos espera e, assim, aprender a conviver com os vários níveis de dor. O tempo demora uma eternidade a passar, quando sentimos dor, mas passa e as melhoras não tardam.
Tenho uma religião que é nadar no mar. Meto o foco em nadar em mar aberto. Mudar espaços — voltei a transformar um espaço, um sótão que estava cheio de tralha, num apartamento onde se vive e convive bem.
Sendo consistente nessa decisão, dando todos os passos de forma sensata, aproveitando o privilégio de o fazer com a maturidade devida à experiência de vida.
Cada um tem de se focar no que quer fazer para se sentir bem, transformar algo em melhor. Se andarmos com a dor de mãos dadas com o amor, superamos a dor com maior facilidade e canalizamos a nossa energia para a construção e alteração positiva. Ter objetivos a atingir fora da doença é importante. Assim, eu vou superando a dor em fase aguda e outras de mãos dadas com o amor à vida. Ter o foco fora da dor e da doença é meio caminho para ter qualidade de vida e vida.
É algo que sentimos e, que muitas vezes, não conseguimos explicar. É tão nossa que, por vezes, mais ninguém a consegue entender.
A dor pode ter várias dimensões: física, psicológica, emocional e espiritual. Somos tudo isto numa só pessoa e, por isso, não podemos dissociar nenhuma destas vertentes.
Iniciava-se o mês de março de 2022, estava numa fase muito boa da minha vida e foi-me diagnosticado um Linfoma de Burkitt. Foi-me dito que era um linfoma muito agressivo, porque cresce rapidamente, mas que, com tratamento intensivo de quimioterapia, a taxa de cura era alta.
E foi só isso que ficou na minha cabeça: “tenho um linfoma, mas tem cura”. O linfoma apareceu sem aviso prévio e, de um momento para o outro, a minha vida deu uma enorme volta. Num momento, estava a comemorar o aniversário do meu filho mais velho, junto da minha família, e, no outro, estava “fechada” dentro de um hospital, rodeada de sofrimento e de caras preocupadas.
Sou enfermeira e, por isso, o ambiente hospitalar não era novidade, mas o facto de estar doente, vulnerável e perante a minha própria morte, era. Eu sempre cuidei dos outros e, agora, era eu que precisava de ser cuidada.
Confirmei, então, na primeira pessoa que são muitas as causas da dor:
O medo do desconhecido e da morte causa dor;
A incerteza causa dor;
A saudade causa dor;
A solidão causa dor;
A falta de liberdade causa dor;
Os procedimentos causam dor;
A falta de privacidade e a exposição do corpo causam dor;
A doença por si só causa dor.
E podia continuar a escrever tantas outras causas de dor que tive de ultrapassar ao longo deste caminho.
Foram sete meses de tratamentos de quimioterapia intensos e de internamentos constantes.
No final do 2.º ciclo fui confrontada de frente com a finitude da minha vida e, pela primeira vez, vi a morte como algo muito próximo, mas resolvi que não era o momento de me entregar a esse destino e que tinha de fazer o meu melhor para ultrapassar mais este desafio. E a minha jornada por esta doença, esta minha nova realidade, continuou.
Gostava de partilhar algumas das estratégias, para além da medicação, que usei para lidar com este desafio e com as diferentes dores que se me foram apresentando:
• Visualização de me sentir curada;
• Oração e a fé;
• O amor da família e dos amigos;
• Utilização de estratégias não farmacológicas para a dor física: meditação, respiração;
• (Cheirar e soprar a vela) e visualização (botão regulador da dor);
• O sorriso;
• Os abraços;
• O chorar;
• O humor;
• Foco na cura e em mim;
• Sentir a natureza (nas minhas curtas saídas do hospital fui sempre ver e ouvir o mar);
• Não perguntar “porquê eu?”, mas sim “vou fazer o meu melhor para ficar curada”;
• Escrever. Escrevi um diário só meu, mas também um diário nas redes sociais em forma de história — a história da princesa Eli.
Passado um ano, a doença está em remissão! Apesar de muito grata pela oportunidade de viver, o processo não acaba. Continuam a existir muitas dores físicas e perdas de memória (dizem que são efeitos da quimioterapia). Existem dores emocionais relacionadas com constantes perdas e lutos de pessoas que fui conhecendo.
Após quase um ano intenso, rodeada de profissionais e exames que me iam garantindo alguma segurança de que tudo estava a correr bem e com um foco preciso na cura, agora existem consultas médicas e exames esporádicos, em que o tempo entre eles provoca incerteza e ansiedade e um sentimento de abandono e vazio.
Considero que, após o tratamento, deveria existir uma equipa multidisciplinar que permitisse a passagem para a “nova” vida e que facilitasse a antecipação de alguns desafios diários relacionados com a parte física, mas também a parte cognitiva, psicológica, emocional, relacional, a reintegração à vida profissional e até mesmo existencial. Este é um elemento fundamental e facilitador para minimizar a dor em todas as suas dimensões numa fase posterior aos tratamentos.
O regresso gradual à vida “normal” não deveria ser tão abrupto, porque a vida que me é apresentada agora em nada é igual à que tinha anteriormente.
Apesar de todo o processo, sinto uma enorme gratidão por poder descobrir a vida no momento presente, aprendendo com o passado e não vivendo demasiado pre”ocupada” com o futuro, aproveitando cada instante com intensidade e, de preferência, sem dor.
O meu nome é Gerson Rodrigues, tenho 38 anos, sou cabo-verdiano e sou tetraplégico devido a um mergulho na praia na ilha do Sal, em Cabo Verde.
O que é, para mim, a dor?A dor é um desconforto que causa incómodo físico e psicológico. Às vezes, é uma sensação de forte queimamento ou de aperto e afeta a minha concentração nas atividades diárias e na minha qualidade de vida.
O que me aconteceu?
No dia 27 de março de 2008, eu estava de folga e, como era habitual, no início da tarde fui à praia fazer natação e exercício físico. Tudo estava a correr bem até que, por volta das 18h, quando já estava prestes a ir para casa, resolvi dar o último mergulho. Saltei de uma ponte e, como a maré tinha baixado, havia pouca água e bati com a cabeça no fundo, fraturando, assim, a coluna na zona do cervical. Após bater com a cabeça, embora tenho ficado consciente, perdi imediatamente todos os movimentos do corpo. Fui socorrido por um amigo, que foi alertado por um turista alemão que viu o ocorrido.
Assim que fui levado para a praia, senti que tinha tido uma grave lesão e que o braço esquerdo tinha sido muito afetado. Isto porque eu sentia o braço em cima do peito e pedia para me esticar o braço ao longo do corpo. As pessoas que me estavam a socorrer respondiam que o braço estava esticado.
Fui transferido do hospital da cidade da Praia para o hospital de São José, para fazer a operação na coluna.
A partir do momento em que comecei a ganhar sensibilidade, começaram a aparecer as dores. Primeiro foram as cãibras no braço esquerdo devido ao peso do braço, principalmente na mão que inchava muito.
Um mês após a operação feita à cervical, comecei a sentir um desconforto na anca do lado esquerdo que, depois de alguns exames, confirmou-se ser uma calcificação óssea. Praticamente são partes do osso que estão a crescer na cabeça do fémur, que me impedem de sentar na posição correta. Quando me coloco de pé, passo muito tempo sentado ou deitado na mesma posição, causam-me muitas dores.
Durante a noite tenho de acordar duas ou mais vezes por noite para mudar de posição.
Sinto fortes dores na coluna, mais concretamente na zona da lombar. Após a lesão na coluna, perdi o controlo dos músculos de todo corpo e, consequentemente, também perdi o controlo do corpo, que faz perder o equilíbrio e me obriga estar sempre com as costas inclinadas sobre o abdómen. Essas dores têm aumentado desde que comecei a trabalhar, porque passei a estar, por vezes, mais de doze horas sentado.
Eu não me costumo queixar das minhas dores para as outras pessoas e tento evitar o máximo possível fazer uso de medicações e analgésicos, mas, quando as dores apertam, eu faço uso de um destes três medicamentos: bene ibuprofeno, paracetamol, Spidifen EF. Acredito que, quanto menos falarmos nas dores, melhor.
Sei que para acalmar as dores que sinto na anca por causa da calcificação óssea tenho que passar por uma operação para remoção os excessos de ossos. Essa é uma ideia que me aflige, porque me faz lembrar de momentos muitos difíceis que passei nos hospitais.
Sou farmacêutica e trabalhei muitos anos em farmácia comunitária, em cargos de direção, sendo que acabei por abandonar a minha carreira há cerca de cinco anos, pois não permitia fazer o acompanhamento do meu filho Vasco. Devido à minha experiência e formação também em Gestão Estratégica de Recursos Humanos, Gestão de Equipas e Liderança, fui dirigir uma clínica médica, permitindo, desta forma, flexibilidade de horários e melhorar a gestão do meu tempo.
De quem eu cuidoO meu nome é Patrícia Quintans, divorciada, mãe de três filhos: Diogo, Vasco e Francisca. O Diogo nasceu no final da minha licenciatura e tem 20 anos; o Vasco tem 13 anos e tem uma doença rara: uma leucodistofia hipomielinizante de etiologia desconhecida, conferindo um quadro de paralisia cerebral; e a Francisca tem três anos e tem Trissomia 21.
O que aconteceu na minha vida
O Diogo e o Vasco são frutos do meu primeiro casamento e a Francisca foi fruto de um segundo relacionamento, que terminou antes do seu nascimento.
Vivo sozinha com os meus três filhos, sendo que tenho guarda partilhada com os pais.
Após o nascimento da Francisca, com Trissomia 21, pedi a licença de assistência a filho com deficiência, de modo a conseguir organizar todas as frentes que tinha em mão. A gestão das consultas, tratamentos, análises, terapias e escolas é feita ao pormenor, sendo da minha total responsabilidade.
Hoje tenho o projeto Patrícia Special Life, que visa a partilha da minha experiência através da visibilidade dada à minha realidade. Dou formação ao público em geral, sou consultora de imagem inclusiva, estou numa ONG — Addapters.org — juntamente com outras mães com quem me identifico a criar e a cocriar projetos de inclusão para pessoas com deficiência e famílias. Faço parte da Inclusive Comunity da Universidade NOVA SBE, em Carcavelos, e sou representante de pais no Agrupamento de Escolas do Vasco, de modo a trabalhar lado a lado com toda a equipa educativa.
A principal dor é o enorme sentido de responsabilidade no futuro dos meus filhos. Sinto-me muitas vezes sozinha a lutar contra o mundo, sinto, por vezes, alguma impotência e cansaço. Todas as decisões que tomo na vida deles são sempre da minha responsabilidade e, quando os resultados não são os esperados, sinto uma enorme culpa e obrigação de rapidamente pensar numa outra solução. A minha vida pessoal tornou-se a quatro, eu e os meus três filhos, sendo que, por veze,s sinto falta de mim.
Como faço para superar a dor
Tenho várias estratégias para curar as minhas dores. A partilha com outras mães é sempre a estratégia mais poderosa — semelhante atrai semelhante. Assim como todos os grupos de partilhas, a identificação e a empatia de quem tem as mesmas dores tornam a dor mais distribuída e mais leve. Outra estratégia que tenho e que vem da herança genética é o cuidado com a imagem. A imagem cuidada aumenta a autoestima que, por sua vez, estimula o quarteto formado pelas hormonas serotonina, dopamina, ocitocina e endorfina, que fazem parte da chamada “Ciência da Felicidade” e dá-nos a força interior para começar um novo dia.
Há cerca de três anos, comecei psicoterapia, meditações e caminhadas de longo curso, de modo a refletir sobre a minha vida e a minha saúde mental. Há cerca de dois anos fiz o Caminho de Santiago sozinha durante 11 dias, o que me ajudou a enfrentar medos intrínsecos a uma maternidade atípica.
Hoje em dia tenho o meu projeto pessoal, Patrícia Special Life, que tem como missão ajudar as famílias a encontrar o seu lugar no mundo, assim como sensibilizar toda a sociedade para as adaptações necessárias a uma verdadeira integração das pessoas com deficiência.
Galeria de arte sobre a dor
Aqui mergulhamos num conjunto de obras únicas: os artistas criaram este fantástico conjunto de imagens, que vão para além do estético e chegam aos lugares mais íntimos dos nossos corações e almas. As imagens levam-nos por uma jornada onde o amor se entrelaça com a união familiar, e a amizade se ergue como pilar fundamental para vencer a dor. Cada imagem é um lembrete de que a beleza e a força podem ser encontradas mesmo nas alturas mais difíceis.